Houve alguém que eu mais amei. Nossa, como eu gostava dele. Quase tudo nele me agradava. Ele era engraçado, inteligente, sensível, carinhos com todos ( bichos de estima, mãe, irmãos, amigos) Comigo também.
Ele amava passear pela cidade. Com ele não se tinha a preocupação de se saber para onde ir. Estava sempre pesquisando sobre shows, eventos, exposições, peças de teatro.
Escrevia música, até banda teve. Na sala da casa dele tem um piano. "E daí", você deve estar pensando. Só que moramos no extremo leste da cidade de São Paulo e aqui a probabilidade de alguém ter um piano na sala da casa é a mesma de eu vir a falar russo. Pouquíssimas.
Na primeira vez que saímos, tocava ópera no carro dele. Eu sabia que era pra me impressionar, as pessoas me acham inteligente e ele deve ter achado que ópera contaria pontos. Mas onde é que ele foi achar ópera em alemão? Todo mundo sabe que a Alemanha é conhecida pelos seus filósofos, ópera não é lá muito a cara desse país. Pois ele tinha um CD de ópera alemã.
Ele era assim meio estranho, meio diferente, meio excêntrico.... E eu gostava muito dele.
Só que ele era muito econômico. Abria mão de um cd, de um filme, um passeio, o que quer que fosse, por melhor que fosse a qualidade, se julgasse o preço muito alto.
Eu, se gostar do objeto pago o que for desde que possa e que não violente meus princípios. Gasto 70, 100 reais em livros sem pestanejar. ( porque me agregam saber, fazem de mim uma profissional e uma cidadã mais esclarecida). Pago 30 ou 40 num DVD sem hesitar. E é com satisfação que desembolso 100 ou 200 numa bolsa ou sandália. Pago à vista ou no cartão, porque me deixam bonita.
Para você que me achou gastona, já explico;
Penso que o valor dos objetos não se resume a dinheiro. Tem mais a ver com o conteúdo dele. Um dvd ou cd do Secret Garden, da Sarah Brightman, do Andrea Bucelli, do Oliver Shanti and friends me são inestimáveis. Ele me falava de o porquê de os cds terem código de barra, que a questão comercial era forte e que preferia ir aos shows. Eu nem dava atenção. Graças a Deus pelos cds e dvds. Pra ver a Sarah eu e uma amiga pagamos 150 reais cada, isso em 2009. E ficamos lá no alto, ela pequenina no palco de uma casa de shows em Santo Amaro. Atravessamos a cidade ( ainda bem que minha amiga dirigia). Chegamos em casa já era madrugada e tínhamos que estar 7 horas da manhã na escola. Foi uma das melhores coisas que fiz na minha vida. Ela estava ali não tão perto de mim, mas perto. E falou algumas coisas em português, e cantou algumas das canções dela que eu mais gosto e que me encheram os olhos de lágrimas. Saímos de lá nas nuvens. Isso não tem preço. Se eu o tivesse convidado ele teria ido? Acho difícil. Nem cogitei. Fui com uma amiga.
Ouvi-los e vê-los me encanta a cada vez. Valem muito mais do que os trocados que os lojistas pedem. A tal quantia, eu a ganharei novamente com o meu trabalho. Para que serve o dinheiro senão para a satisfação de nossas necessidades? Eu necessito de beleza.
Mas não pago as mesmas quantias se descubro ser o produto resultante de trabalho escravo.Certo tênis, cuja propaganda é feita por gente famosa, apesar da qualidade e da beleza não compro nem amarrada. Porque meus valores são outros.
Não estou dizendo que o belo tenha de ser caro. Quem se dedica a pesquisar acha preços ótimos já que os valores cobrados estão inchados de cobiça e de impostos.
Sei de alguns lugares cujos preços são mais em conta e é com eles que me supro de livros, filmes e músicas.O tempo da pesquisa eu gasto lendo, escrevendo, dormindo, caminhando, sentada na grama dos parques da cidade, sob as árvores.
Para você que me acha simplória, também me explico.
Há quem pague, 400 ou 500 numa bolsa. No entanto, essa quantia é quase um 1/5 do salário de um professor da cidade de São Paulo. No nosso caso, não me parece sadio gastar tanto numa bolsa. E é também quase que um salário mínimo, é quase que obceno. Uma bolsa custando o que é pago por mês aos aposentados e pensionistas? Eu não conseguiria.
Quando saímos ele fez questão de pagar a conta. Mas eu insisti em pagar minha parte, porque ele reclamava das quantias apontadas pelo impostômetro. Eu não dizia nada. Mas pensava comigo que sem impostos como manter a cidade. O que precisa ser repensado é o gasto que se faz com essas somas, é a falta de sabedoria nossa na hora de votar, mania brasileira de escolher político desonesto, que não sabe ser agente público, que não honra o nome do pai e da mãe que carregam ( se bem que muitos aprenderam foi com os pais.. Mas então era o caso de ensinarem os pais a serem gente de bem.) e sendo eu e ele professores, ganharíamos mais esclarecendo as futuras gerações que reclamando.
Quando ele me disse que não pagaria 10 reais na entrada do cinema vi que a gente não tinha futuro. Veja, nós professores pagamos metade da entrada e ele achava muito... Eu amo cinema. A sala escura a tela enorme, o filme meio que engole a gente, dependendo da qualidade da fita você só se lembra de quem é quando a história termina. Tenho lembranças tão doces do cinema. Da Irleide de olhos marejados ao lembrar do pai quando assistíamos Inteligência Artificial ( a do menino robô que queria uma mãe, lembra?) É baseado num dos contos de um livro de ficção científica, temos na escola. Toda vez que olho para o robô da capa eu lembro do amor da Irleide pelo pai dela.
Lembro quando levei meu irmão e minha prima para assistirmos a segunda Parte de O senhor dos anéis. Na primeira, Gandalf lutou com o demônio que ele tanto temera. Aquela imagem enorme e a música, que é explêndida. Quando ele bateu o bastão no chão e gritou para o demônio muito maior que ele:. "Você não vai passar!"( em inglês é mais intenso) e mandou que os amigos fugissem... Eu achei aquilo de uma coragem e nobreza! Mas ele caiu com o monstro e eu saí da sala triste. Um ano depois eu louca pra saber do Gandalf. E levei os adolescentes da casa.
Amei vê-lo já nas primeiras cenas derrotando o tal demônio e se transformando num mago branco. Ao vencer seus medos ele se elevou. Eu vejo um valor nisso que ninguém faz ideia. Os meninos tomaram refrigerante, comeram pipoca com manteiga. E eu também. Que coisa boa! Depois comprei o livro O Robbit. A minha prima, de 16 anos, que nunca lera livro algum o devorou em poucos dias. Horas sentada com o livro azul no colo. Eu deveria ter tirado uma foto, para mostrar para ela que hoje é mulher adulta e mãe.
Acabei me distanciando dele. Dinheiro é uma questão relevante num relacionamento. E se eu dissesse que planejo ir a Paris? Que quero fazer o caminho de Compostela? Acho que não teria a sua companhia. E o melhor da vida é poder compartilhar esses momentos com quem amamos. Comecei a achar que não seria assim conosco. Então pra que ficarmos juntos?
sei que é no centro velho da cidade. Eu tinha