Sendo a Ostra um molusco, frágil e indefeso ante os perigos do mar, Mãe
das Águas dotou-a de uma casca lisa e rósea. Acreditando-se protegida, a Ostra
decidiu que era feliz.
Mas, num fim de tarde cinzento, não se sabe por que, Grão de areia
acercou-se da Ostra. Era um grãozinho falante, às vezes áspero, às vezes
contraditório em seus dizeres, que saíam aos borbotões, principalmente quando
entusiasmado por algum assunto.
Ostra, muito segura em sua casca e em sua experiência, fruto das longas
horas passadas na observação do mar e de seus habitantes, uma vez ou outra se
punha a ouvir o seu novo amigo se este, animado pelo embalo do vaivém das
águas, dizia algo engraçado ou profundo.
Mas as águas nem sempre as mesmas. Manhã escura, mar encrespado, ondas rebentando
na praia, o Grão, assustado e agora afeiçoado à Ostra, instalou-se
sorrateiramente dentro do experiente molusco. Bem que Ostra tentou livrar-se de
Grão de areia, mas não houve jeito, este decidira que Ostra seria sua morada e
nela fincou bandeira sem pedir licença.
E daquele momento em
diante Ostra declarou-se desafortunada porque lhe doía o
roçar do áspero grão em seu corpo macio.
- Oh! Mãe das Águas, por que este
serzinho imaturo foi fazer morada justamente em meu ventre? - indagou Ostra,
olhando por cima de si as águas turvas, tão perplexa e triste. Mas Mãe das
Águas nada respondeu.
E porque precisava amenizar sua
dor, Ostra resolveu que tiraria algum proveito do seu sofrimento. Mas faltava-lhe
o equilíbrio: ora via o Grão como um novo amigo, um companheiro de jornada, com
o qual compartilharia os seus saberes ora se calava magoada, diante da atitude
desonesta do intruso.
E assim viveu por muito tempo Ostra, que não mediu esforços em adaptar-se
ao companheiro. Até ela sentiu um dia, que Grão não a incomodava mais.
E Ostra deu pela falta do
desconforto que a presença do companheiro costumava lhe causar.
E os olhos de Ostra se voltaram para o que lhe ia dentro, tatearando pela
presença áspera de Grão para pousar numa Pérola brilhante e lisa.
Mãe das águas sabe o que faz.
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